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A “Matrix” do Senhor Bercow

Ricardo Bandeira Jorge

Já estamos a viver numa “Matrix” (é preciso que tenham visto o filme… espero que tenham visto o filme… toda a gente o viu). Eu pelo menos estou. Não considero o Facebook e as redes sociais uma tecnologia que está para lá de nós, mas uma tecnologia que nos engoliu. Eu vivo feliz e contente lá dentro. Apenas vou lá fora um bocadinho, de vez em quando, para apanhar ar.

Isto de ser-se um híbrido tecnológico é um problema. Depois de um dia de trabalho, em que se tem que ler e responder a inúmeros e-mails, consultar repetidamente os sites da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa e da DGSI, o Diário da República Eletrónico, acompanhar as plataformas eletrónicas, fazer telefonemas, actualizar as publicações, mandar um “WhatsApp”… preciso de desconectar. É que não consigo estar 24h em rede.

Contudo, esta coisa de ir apanhar ar… é irritante. Sobretudo quanto olho para àqueles miúdos digitais para quem isto da tecnologia é uma coisa natural. Comparado com eles sinto-me um Palhaço Popov que lá vai fazendo um exercício inglório de malabarismo com pratos em que estes irremediavelmente têm que cair. Mas, por outro lado, parece que ainda não é bem certo que isto do desconectar seja bem permitido. Dizem por aí que até pode ser fundamento para despedimento (afinal, isto do “burn out” até que pode ser só um mito urbano). Portanto, há que persistir com o malabarismo.

E com mais um contorcionismo para tentar aperfeiçoar este malabarismo, lá vou “gostanto” de uma série de canais informativos (com algumas “fake news” a meu gosto, óbvio) até esgotar o meu feed do telemóvel. Assim, estou sempre a entupi-lo com informação e mais informação, pelo que, quando sinto que preciso de desconectar posso logo ir ligar-me a outra coisa qualquer. Desconecto-me para me manter ligado, qual pausa para fumar um pensativo cigarro. Tomem lá miúdos digitais. O Popov, qual verdadeiro cão de Pavlov, ainda está na corrida.

Ora, nesta corrida entre ligações descobri o meu “guilty pleasure”, a minha “novela da TVI”: o Brexit. Mais precisamente o debate no Parlamento britânico sobre o acordo de saída da U.E. Que beleza! Bastou-me subscrever o “The Guardian” e permanentemente chove-me no telemóvel e no mural do Facebook novidades e novidades. As de 09 de Janeiro, então, foram deliciosas! No meio do debate daquele dia eis que um deputado da bancada conservadora – a bancada do governo – propõe que seja colocada à votação uma alteração à proposta de acordo de saída negociado entre a Sr.ª May e a Comissão Europeia. Segundo essa alteração, caso o governo britânico perca a votação no Parlamento, a Sr.ª May terá apenas 03 dias para voltar a apresentar novo acordo, o qual, se votado e também derrotado permitirá ao Parlamento decidir livremente como sair desse impasse: partindo a loiça e saído sem qualquer acordo, marcar novo referendo para que os Cidadãos se pronunciem, ou não sair do todo da U.E. (entre outras alternativas).

Deputados Conservadores logo rugiram para o Sr. Bercow, Presidente do Parlamento, que tal alteração, à luz dos procedimentos daquela Casa, só poderia ser propostas por um Ministro, nunca por um simples deputado! Era este o precedente. Responde o Sr. Bercow: “De que serve o precedente se não for para ser quebrado de vez em quando? A proposta será votada agora.” Mais rugidos, mais berros. 20 deputados do Governo votam contra o próprio Governo e este perde a votação. Histeria e júbilo! O Legislativo afasta o Executivo e poderá ter a última palavra sobre o Brexit. Mais um dia em que a Sr.ª May é recordada que o Executivo não é um poder absoluto. Por membros do seu próprio Partido. Em life streaming.

As redes sociais são fantásticas. Inflacionam tudo o que é belo. Passam a melhor imagem de nós próprios (aquela que gostaríamos que os outros acreditem). Nelas somos mais sorridentes, fortes, e saudáveis. Até um simples Presidente de Parlamento se consegue tornar no “Sr. Bercow, o domador de executivos”. Até deputados conseguem votar de acordo com a sua consciência. A “Matrix” é linda e nós vivemos todos lá dentro.

 

 

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Autor: Carlos A. Sêco

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