José Oliveira
Não sei se alguma vez um colaborador do prestigiado diário madrileno El Pais prestou colaboração voluntária a qualquer jornal português. Cartoonistas, apostaria que nenhum. Exceptuando Forges, que distinguiu o nosso suplemento BronKit por várias vezes com a sua chispa de génio. Numa dessas ocasiões, usei para capa do nosso jornal humorístico o desenho que Forges nos havia enviado. Era um cartoon em que um jovem se passeava na paisagem com este balão de pensamento: “Penso, logo estorvo”.
Provavelmente, a quase totalidade dos leitores do BronKit terá lido isso sem ter tomado consciência de que estava perante um cartoon de uma das duas ou três maiores referências do género em Espanha (onde há muitos e bons profissionais da matéria).
Forges, que era neto de portugueses e fora assistente de realização televisiva na TVE antes de se profissionalizar no desenho satírico (El País, El Jueves, Hermano Lobo, Interviu…), morreu no passado dia 22.
Agora, desfolhando papelada à procura de outra coisa, tropecei na edição do El Pais de 25 de Junho de 1995, em cuja primeira página se anuncia (em nota com ilustração sua) o início, nesse mesmo número, da colaboração de Forges. Nessa altura, já com 30 anos de actividade satírica e tendo abandonado meses antes a sua colaboração no diário conservador El Mundo, o mestre do humor gráfico declarou ao El Pais que mudava de jornal “para poder recuperar mi própio equilíbrio”. Quem conhecia o seu permanente espírito de combate, compreende facilmente o sentido desta sua afirmação.
No Trevim já não há BronKit; mas em Espanha ainda existe El Pais. Porém, lamentavelmente, quer um quer outro jamais poderão contar com a colaboração de Forges, que me chamava Pepe que é como se diz Zé em castelhano e, durante o almoço do nosso primeiro encontro, desenhou a minha caricatura (que tenho emoldurada na minha casa da Lousã).
Em sua memória, e “para poder recuperar mi própio equilíbrio” perante a mágoa da sua abalada, termino com a frase lapidar que Forges um dia escreveu na capa do BronKit: “Penso, logo estorvo”.
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