O comboio de alta velocidade vai irrompendo pelo interior da China, mostrando-me um cenário a mudar timidamente. Ao longe, avisto uma igreja, provavelmente católica. Umas dezenas, ou centenas de quilómetros mais à frente, surge outra. Mas não estão sós. Os minaretes das mesquitas começam também a preencher a linha do horizonte, num claro sinal de que o Islão aqui marca igualmente presença.
Meto conversa com um grupo de quatro chineses que se dirigem também para Lanzhou, como oradores num colóquio que a universidade estatal irá realizar. Curiosos e fascinados pelo Ocidente, não deixam escapar a oportunidade de, nos intervalos de algumas questões sobre o meu país, ou sobre a Europa, indicarem efusivamente que já tinham viajado por alguns dos destinos mais badalados do “velho continente”. Paris, sublinham, está no topo das preferências. São também gente afável e disponível para me ajudar. Mostro-lhes o nome do local que tinha reservado algumas horas antes e tentam perceber qual a melhor forma de eu lá chegar em transportes públicos, escrevendo-me em mandarim o nome da paragem onde sair.
Paguei apenas um yuan, o que equivale a cerca de 0,13€ por um autocarro que me levaria para o centro da cidade. Sinto que agora entrei noutra China, num país mais autêntico e menos virado para os estrangeiros. É aí que começo a tomar consciência do que me esperaria no resto da viagem. Ninguém fala inglês, mas não falta vontade de ajudar o alienígena vindo do outro lado do mundo que era eu. Abandono o autocarro na paragem desejada, sentindo que metade do desafio estava já ultrapassado. Mas falta-me agora encontrar a porta certa. Ninguém sabe o nome em inglês que eu mostro e as boas intenções de nada me servem se ninguém me dá uma pista para eu conseguir chegar ao hostel que tanto desejava encontrar pois encontro-me faminto e exausto. O desespero vai subindo em proporção inversa à calma. Pergunto a uma jovem que trabalha num restaurante pelo meu oásis neste deserto urbano. Ela não o conhece, mas o colega de trabalho indica-lhe que a morada não será longe dali. Quero acreditar que estou já a ver uma luz ao fundo do túnel e agradeço a amabilidade que tem de ir comigo à procura do meu poiso. Saímos da rua principal e perdemo-nos por uma ruela. Ela própria não faz ideia onde será e pergunta a alguém que lhe estende o braço com o dedo indicador, direcionado quase para o topo de um prédio. O seu olhar triunfal, que traduzia uma certeza, mostra-me o meu paraíso.
Não há uma única indicação do espaço, nem sequer em mandarim. Acompanho a guia de recorrência, que me deixa num quinto andar, à porta do alojamento. Surge um casal jovem, que não contava mais de 22 anos e que não falava inglês. Com uma expressão de embaraço e preocupação, tentaram explicar-me algo, mas era imperceptível. Com a ajuda de uma aplicação de tradutor no telemóvel, ouvi de uma voz eletrónica que não podia dormir ali pois era estrangeiro. A noite não acabava já para mim.
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