José Luís Santos
Desta vez as chamas não pouparam a Serra da Lousã. E foi o horror que se viu. Mau demais para ser verdade. Tal como eu, creio que muitos de nós, e falo das pessoas da minha terra, ainda nem conseguimos digerir toda esta desgraça pois foi tudo muito rápido e, subitamente, a imagem que tínhamos deste espaço comum mudou abruptamente. Tal como para mim, para muitos daqueles que poderão estar a ler este pequeno texto sentirão que ela era (ainda é, e continuará a ser) o nosso habitat, quase que um refúgio, ou quintal para onde gostávamos de ir, fosse a pé, de bicicleta ou mesmo em veículo motorizado. Faz parte da nossa memória coletiva, pois todos nós já aí vivenciámos momentos que tanto nos dizem.
Não sou técnico nestas lides da floresta, e não aspiro a ser treinador de bancada. Na qualidade de mero cidadão que já presenciou momentos com algumas semelhanças, como foi o caso dos incêndios de 1998 e 1999 na zona do castelo e aldeias serranas, ou o fatídico dia 15 de Outubro de 2017, com o fogo que varreu boa parte de Serpins e arredores, pergunto-me a mim mesmo: não obstante as delicadas conjunturas que possibilitaram estes infortúnios, como as questões de foro meteorológico, será que não aprendemos nada com os erros do passado? Parece-me uma questão pertinente de ser colocada às entidades responsáveis, seja a nível local, ou nacional.
Boa parte da serra estará ainda a fumegar, e algumas zonas infelizmente ainda a arder, como resultado daquela que é a maior tragédia deste tipo pelo menos neste último meio século na Lousã, a julgar pelos danos não só florestais, e pelos animais que terão aí perecido, como também pelas implicações que tudo isto terá, por exemplo, para o turismo.
Perante este cenário dantesco com que nos agora confrontamos, e que tanto nos custa ver, e supondo que esta foi uma situação limite (sim, na realidade, ultrapassou os limites do nosso entendimento em muita coisa) creio que será importante meter um pouco de lado algumas reações emotivas relativas a uma tristeza que todos efetivamente partilhamos, ou de apontar dedos para justificar este cenário apocalíptico que se instalou na nossa serra (sem, contudo, ilibar responsáveis, se os houver) e tentarmos agir de uma forma racional, concertada e construtiva perante aquilo que acredito que sentimos como um bem maior.
Desta forma, e, repito, num sentido construtivo e alheio a joguinhos de arena política, olhando com alguma preocupação para o futuro, apreensivo com a falta de estratégia que houve no passado, e perante quase uma tábua rasa a que a Serra da Lousã foi sujeita, eu pergunto:
1 – será que é desta que se fará um verdadeiro ordenamento deste espaço, em vez de se deixar que a floresta volte a crescer de uma forma aleatória, sabendo nós que isso significará também uma ainda maior expansão de eucaliptos e acácias?
2 – supondo que haverá alguma sensibilidade e genuína preocupação com esta reconfiguração da floresta pelo menos a nível local, serão as autoridades competentes (sejam ela quais forem) a levar essa tarefa a cabo, ou vão desresponsabilizar-se de uma função que lhe deveria competir ao reduzi-la a ações de voluntariado (que também são bem vindas e urgentes nestes tempos, mas insuficientes para esta empreitada que se afigura tão grande quanto urgente)?
3 – Já que estamos a falar de reflorestação, será que é desta que se mete um travão à expansão desenfreada de eucaliptos?
Em contraponto com isso, será que é agora que se irá apostar de uma forma séria na plantação de árvores autóctones, como os carvalhos, castanheiros, sobreiros e outras que voltem a dar não só encanto como também autenticidade e, acima de tudo, segurança à nossa serra pois, como bem frisou o João Ramos, jornalista da CNN nascido e criado também nesta terra, são essas árvores que são muito mais eficazes que os corta fogos ao evitar a propagação dos incêndios?
4 – Já que estamos a falar de uma replantação organizada da nossa serra, que promoveria também as espécies autóctones, pergunto se não seria sensato, já a pensar em situações futuras, que, à semelhança do que se fez na aldeia da Ferraria de São João após o fatídico 17/18 de Junho de 2017, promover-se um anel de proteção de pelo menos 50 metros em redor das nossas aldeias serranas onde fosse proibida a plantação de árvores de fácil combustão (eucalipto, pinheiro e acácia) onde predominariam árvores que retardariam o fogo como os já referidos castanheiros, carvalhos e sobreiros?
E haveria muito mais a sugerir.
A Serra da Lousã não pode ser uma casa roubada em que nem assim se põem trancas à porta.
Não servirá de nada estarmos agora a chorar sobre o que aconteceu e a repetir frases de circunstância se depois nada for feito de uma forma séria, empenhada e vista como um legado que possamos providenciar às gerações vindouras, pois deveria ser para essas que, se tivéssemos visão a, pelo menos, médio prazo, deveríamos canalizar todo o esforço para esta muito nobre tarefa que se avizinha.
Teremos de arregaçar as mangas, mas isto não poderá ser feito sem uma sinergia entre várias parte da nossa sociedade local, de uma forma transversal ao panorama político, social e económico local.
Não haverá desculpa para qualquer tipo de inércia ou irresponsabilidade para quem chefiar o executivo após as próximas eleições de outubro e tiver de gerir esta pasta tão fulcral para o futuro deste concelho.
Para que daqui a uns anos, quando estiverem com os Lousanenses que entretanto nascerem, poderem lembrá-los que em meados de Agosto de 2025 houve um terrível incêndio na Serra da Lousã mas que, ainda não refeitos desse choque, puseram mãos à obra, entenderam-se com uns quantos conterrâneos e conseguiram, cada um no que poude, voltar a dar vida a este tão valioso património que nos é comum.
Cá estarei para fazer a minha parte.
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