Afonso João Teixeira
Estudante Secundário e Membro da Juventude Social Democrata
Portugal encontrou no 25 de Abril de 1974 a oportunidade de conquistar não apenas a liberdade política, mas também o direito a construir um Estado que protege, ampara e promove. O Estado Social democrático, o garante de direitos fundamentais: da saúde à educação, da segurança social à conciliação entre vida familiar e profissional. Mas esses direitos, por mais nobres que sejam, não existem no vazio: devem ser exercidos com integridade e protegidos contra o abuso, sob pena de se esvaziarem no seu valor.
Antes de iniciar este artigo de opinião sobre a recente polémica em torno da ‘Lei da Amamentação’, gostaria de reiterar o meu maior respeito pelas mães deste país, assegurando que este texto em nenhum momento se pretende um ataque à sua condição ou dignidade.
Importa começar por esclarecer um ponto essencial: não existe a tal “lei da amamentação”. Esta é uma expressão coloquial, amplamente utilizada pela imprensa, para se referir ao direito à dispensa para amamentação, consagrado nos artigos 47.º e 48.º do Código do Trabalho (Lei n.º 7/2009). É aí que se regulam os termos em que as mães trabalhadoras podem beneficiar de tempo remunerado para amamentar os seus filhos, garantindo a conciliação entre maternidade e vida profissional.
O que esteve recentemente em discussão e gerou uma onda de interpretações precipitadas, a meu ver erradas, não foi a extinção de um direito, mas sim uma revisão do regime de fiscalização do seu uso, nomeadamente com a introdução de uma eventual obrigatoriedade de apresentação de atestado médico de uma forma sistemática desde o início da dispensa, a renovar a cada seis meses. Importa referir que estas alterações não foram ainda legisladas e não fazem parte do regime legal em vigor.
O que se tem assistido, em vários setores, é à utilização indevida deste direito por quem já não amamenta ou nunca o fez, beneficiando, sem qualquer verificação, de horários reduzidos durante meses ou anos. Estes casos claramente não representam a maioria, contudo, diminuem a credibilidade da norma, colocam empregadores sob pressão injusta e desvalorizam as mães que, com sacrifício real, cumprem e merecem plenamente esse apoio.
Sou, por isso, inteiramente a favor desta verificação do regime, e reforço o termo verificação. Não por desconfiança em relação às mães, mas precisamente por respeito a todas aquelas que, de forma honesta e sacrificada, cumprem com o seu dever e usufruem legitimamente de um direito que lhes é garantido. Manter um sistema sem qualquer fiscalização é atentar contra a credibilidade do próprio Estado Social, e um Estado que não é eficiente, não é respeitado.
Além disso, tolerar abusos sistemáticos é uma afronta maior às mães portuguesas do que qualquer alteração legislável. Porque são precisamente esses abusos que colocam em causa o equilíbrio das equipas de trabalho, criam desconforto nos locais de emprego e alimentam uma perceção de injustiça que recai, injustamente, sobre todas as trabalhadoras. O verdadeiro desrespeito não está na exigência de um atestado médico, está na banalização de um direito nobre e necessário.
Proteger as mães é também proteger os seus direitos. Ignorar os abusos não é um gesto de empatia, é, a meu ver, um silêncio cúmplice que sabota a confiança no Estado Social que Abril nos deu. Porque liberdade sem responsabilidade não é liberdade: é descuido. E direitos sem consciência não são direitos: são privilégios vazios. Um país é mais forte quando os seus direitos são respeitados, não quando usados para oportunismo.
Fontes consultadas:
- Diário da República, Lei 7/2009 ou Código do Trabalho, Art. 47º e 48º
- Sic Notícias
- Expresso
- Observador
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