
Em face do vazio constitucional quanto à concretização da liberdade de autonomia positiva, o sistema eleitoral instituído não necessita de violar qualquer preceito para depositar nos partidos – que estão de acordo quanto ao essencial dos seus interesses privativos, ainda quando isso não pareça na representação dos seus atores – os direitos políticos mais relevantes dos cidadãos. De tal modo que sem a sua autorização o único direito efetivo que lhes fica disponível é o de votar em liberdade. Evidentemente, apenas nos candidatos aos cargos políticos previamente selecionados pelos partidos.
Os partidos conduzem assim os “cidadãos” de qualquer povo sem capacidade crítica, ao êxtase de se considerarem participantes de decisões políticas e também “proprietários” sem lucros, mas com prejuízos, do partido a que entregam o voto. Mas a verdade é que são apenas figurantes. Não é que o povo não seja potencialmente capaz de perceber e de decidir com liberdade. Porém seria indispensável uma pedagogia política sobre a convivência cívica, que não interessa aos beneficiários do sistema fazer, nos meios de comunicação social e, sobretudo, na televisão, com a preocupação de explicar, naturalmente e sem preocupações técnicas, o que é o Estado e o Poder, de que repetidamente se fala, e em que consiste a intervenção democrática dos cidadãos, que relativamente poucos entendem, incluindo muitos dos que desempenham funções políticas.
Se os partidos desempenhassem as funções pedagógicas de que se invocam agentes qualificados, como entidades de serviço público, algo poderia mudar, sem embargo de uma das suas características ser a unilateralidade.
No entanto atuam como empresas de gestão de influências político-administrativas em benefício principal do aparelho e da clientela e de tudo que possa servir de suporte da sua organização, sempre assente em múltiplas “fidelidades”, ainda que geralmente sem circunstância para as lealdades.
Caracteriza-os a apetência de benesses e privilégios que o Estado pode proporcionar, o que se torna mais visível quando o eleitorado pelo sufrágio os autoriza a exercitar o aparelho da administração pública, onde se instalam, criando para o efeito burocracias e tecnocracias paralelas.
O povo soberano, aturdido pelo espetáculo da política e dos políticos nos dias de hoje cada vez mais evidente e devido a este condicionamento, só em alturas da crise que perpassa no seu quotidiano – saúde, habitação, educação – é que se interroga sobre o modo como os impostos são utilizados, o que se tem feito com as sucessivas levas de fundos comunitários e como é possível enriquecer tão depressa e sem causa visível, como o enriquecimento não paga impostos e como na proximidade dos atos eleitorais o (s) partido (s) que exercita (m) o aparelho do Estado aparece (m) a inaugurar o que muitas vezes não está concluído e as demais elites políticas se mostram tão preocupadas com os que votam, dizendo-lhes em promessas o que sabem que eles gostam de ouvir, ainda que na certeza de não cumprir.
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