Conto de Jó Dutra
Era uma vez uma aldeia, daquelas onde todos se conhecem, no vale de uma grande montanha, junto a um bosque muito verde e fresco chamado Bosque das Pinhas.
Era um sítio composto apenas de pinheiros-bravos e mansos, que davam muitas pinhas que caíam e enchiam todo o bosque. Quando chegava o inverno, tudo se tornava branco e ainda mais belo.
Não muito longe da aldeia, mais ou menos no meio do Bosque das Pinhas, vivia numa pequena casa de madeira um casal de idosos.
Poucos na aldeia tiveram a sorte ou o azar de os terem visto, pois eram considerados bruxos e todos evitavam aproximar-se deles ou frequentar aquela parte do bosque.
Quem os viu disse que tinham aspeto medonho. Contava-se que tinham matado o próprio filho único para se apoderarem da sua alma e ganharem mais poderes para os feitiços.
Dizia-se que no inverno, pela altura do Natal, faziam uma prenda para que mais crianças pudessem ser atraídas à sua casa e assim a prenderem.
Não havia dúvidas de serem pessoas de coração frio, despidas de qualquer sentimento.
Na aldeia vivia um menino chamado João. Muito esperto, divertido e, acima de tudo, aventureiro e muito curioso.
Certo dia, depois de conhecer a história do casal de velhinhos, teve a curiosidade de saber se realmente o casal seria tão mau quanto diziam os seus pais e os amigos.
Considerando que nada lhe aconteceria, pois tinha como protetor o seu amigo Jesus, decidiu pintar um Natal diferente: ir desejar boas festas aos anciãos. E assim foi!
No dia 24 de dezembro, disse aos pais que ia passear à procura de pinhas de Natal, que brilham no escuro de forma muito intensa e que só se encontram no bosque entre a tarde do dia 24 e a manhã seguinte.
Segundo os aldeões mais velhos, eram fruto de um feitiço do misterioso casal para atrair os moradores.
Nunca ninguém tinha tido a coragem de apanhar nenhuma dessas pinhas. Mesmo assim, o João foi sem medo, já que as pinhas de Natal eram apenas uma desculpa para ir ao bosque.
Depois de almoçar, lá foi em direcção ao bosque. De início, teve algum receio, mas à medida que caminhava a coragem ia aumentando.
Andou durante quinze minutos, tempo em que pôde pensar sobre o verdadeiro significado do Natal. Todos os anos tudo se repetia. As mesmas pessoas, a mesma troca de prendas e os mesmos beijos.
Um mero ritual em que tudo se mantinha. O Natal estava a perder o sentido, pois era festejado apenas como uma tradição e como festa rotineira igual a tantas outras.
O verdadeiro Natal, o nascer dando a nascer, estava esquecido. Este ano, o João queria um Natal de verdade.
Os dois velhinhos, que até podiam ser mesmo bruxos maus, iriam conhecer este ano o Natal, porque iria levá-lo a sua casa.
No fundo, para ele, eram dois pobres rejeitados que talvez nunca tivessem vivido o verdadeiro amor. Enquanto pensava em tudo isto, a sua coragem aumentava.
Ao passar por um pequeno riacho, apanhou um pequeno ramo de flores silvestres, pois não queria desejar um bom Natal sem uma prenda, por mais simples que fosse.
Finalmente, avistou a casa. Era pequena, toda em madeira e não tão assustadora quanto isso.
No entanto, aquela parte do bosque era um pouco mais escura, dando a ideia de já ser de noite.
Por momentos, a coragem do João quis abandoná-lo. Contudo, não desistiu e caminhou em direção à porta do casebre, que tinha as luzes acesas e o fumo a fugir pela chaminé.
O silêncio falava alto quando se aproximou e bateu duas vezes. Ninguém respondeu. Bateu um pouco mais forte. De repente, ouviu a fechadura da porta, que se abriu lentamente.
O João viu então surgir o rosto de uma mulher idosa, que, contrariamente ao que pensava, tinha tudo menos aspeto de bruxa.
Tinha cabelos brancos, pele lisa e olhos azuis. Tinha, no entanto, um ar triste e sem vontade de viver.
Junto à lareira, estava um homem sentado numa enorme cadeira de madeira que se levantou e também se dirigiu para a porta.
– Olá, meu filho, o que desejas? Estás perdido? – perguntou a mulher.
– Não, não estou perdido. Vivo na aldeia e vim desejar-vos um feliz Natal, pois vivem aqui sem ninguém. Trouxe também estas flores. Uma pequena lembrança, nada mais – respondeu o menino.
Os rostos dos dois velhinhos encheram-se de lágrimas. Contaram-lhe que tiveram um filho que morreu ainda muito pequeno.
Desde então, fecharam-se em casa, esperando que este voltasse um dia para os alegrar. Ninguém mais se aproximou deles.
Este ano, o menino voltou para realizar o seu sonho. João era esse filho. Mostraram-lhe uma sala com muitas prendas.
Em cada Natal, faziam uma prenda diferente na esperança de que o filho voltaria para a ir buscar.
Todos esses presentes eram agora do João, que na verdade era o filho daquele casal tão meigo.
João contou a história aos pais que aceitaram o casal a viver na família. Nunca mais os idosos ficaram sós. Tinham reencontrado o seu filho.
Quanto às pinhas de Natal, eram as lágrimas que caíam do seu rosto na noite da consoada.
Por magia, brilhavam toda a noite, talvez a pedir carinho ou que as pessoas vissem a sua falta de amor. De manhã, voltavam a ser pinhas.
A partir desse dia, o João e os pais entenderam que o Natal deve ser vivido todo o ano e que nunca é tarde para o verdadeiro Natal, aquele que nasce em nós, depois de o termos dado a nascer.
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