
A magia da vida é vencer as incógnitas do quotidiano, conhecer os «mistérios» e passar para o outro lado do espelho da imaginação. A melhor forma de viajar nesse universo irreverente é através do humor, dos exageros da caricatura, do grotesco da máscara.
A máscara tem na sua génese a magia dos cerimoniais espirituais, absorvendo em si a representatividade dos deuses e espíritos, adicionando posteriormente o dom de representação das personagens das dramaturgias tradicionais, transformando-se em elemento de «festa» popular e palaciana. Inesquecíveis são as máscaras fúnebres egípcias ou ameríndias; as máscaras religiosas de Bali, Índia, África, Esquimós… teatrais dos gregos, da «Comédia dell’Arte», do «Khôn», «No»… dos Carnavais de Veneza… A máscara, tal como o humor é uma síntese elaborada com exageros para melhor veicular o condão sacro, cómico, onírico, satírico, horrifico… ideais para esta época carnavalesca.
O ano são 365 dias e o Carnaval cinco… Não! A vida são dois dias e o Carnaval três, por isso temos de aproveitar todos os seus benefícios. Colocar a máscara é assumir um espírito, uma personagem, afastando-nos jocosamente do nosso eu, para viver a folia de outra existência sem preocupações, sem medos, proporcionando assim o portal da revelação do lado oculto do esotérico.
A máscara carnavalesca tem essa função, porque não nos esqueçamos que o papel do Entrudo, além do entretenimento, do cómico libertador, é um ritual para dar força à regeneração da natureza (na Grécia estava ligada a «Dionísio», em Roma às «Saturnálias»…) com os exageros da bebida, da comida, da alegria… Com o Cristianismo, ficou como explosão dos prazeres antes da penitência, dos quarenta dias de abstinências, até à ressurreição na Páscoa.
O Carnaval (cómico, humorístico) é assim um elemento expurgatório, profiláctico, expulsando da natureza, da sociedade e do indivíduo, os maus espíritos, os males infligidos pelo Inverno (das existências). É a purificação da alma, para receber a Primavera e os novos valores da regeneração, cerimonial que termina com as «cinzas», que nos relembram a brevidade e insignificância da vida material.
Todos os povos têm as suas próprias máscaras, umas inventadas politicamente, outras reinventadas como atracção turística. Há as contemporâneas (feitas industrialmente na China), e outras mais tradicionais, e a nossa cultura, felizmente, manteve alguns desses testemunhos ancestrais, principalmente no nordeste, onde a máscara ainda mantém a magia da irreverência telúrica dos humores do povo.
Hoje, outras máscaras se impuseram, mais trágicas do que cómicas com as quais procuramos sobreviver da melhor forma com optimismo. Vivamos pois o Carnaval da existência com o melhor humor possível, como uma terapia saudável, uma homeopatia universal e democrática, cheio de sorrisos e esperança.

Desenho de Voland (Roberto Castillo) (Cuba)Humores do Mundo – A Máscara Carnavalesca
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