Editorial de Fortunato de Almeida, diretor do Trevim
É geralmente reconhecido que os que capturam o aparelho do Estado tratam de lhe conferir, ainda que informalmente, uma estrutura à medida dos seus interesses. Assim, o sistema eleitoral, a estrutura político-administrativa, a administração financeira, a intervenção dos capitais públicos na economia privada, o preenchimento dos cargos políticos, tudo é concebido conforme a conveniência do partido que ocupa o aparelho político.
As oposições, obviamente, denunciam as manobras dos que estão nas cadeiras do Poder mas, logo que lá chegam, procedem de idêntico modo. Na sua concepção, a política é a arte de capturar o aparelho do Estado, ficando o serviço da comunidade em segundo lugar. Por isso, o que imediatamente sucede quando um projeto político é substituído por outro mediante o sufrágio, é também a substituição da clientela que ocorre.
A efetiva democracia exige espírito cívico, debate de ideias, combatividade na defesa de convicções e pessoas suficientemente esclarecidas para perceberem que a conivência entre a oligarquia do Poder e os interesses instalados, conduz a abusos que a sociedade civil sempre paga.
A democracia só é viável, efetiva e útil para todos, na medida em que a generalidade dos cidadãos compreenda que o parentesco ideológico e a intimidade ou a proximidade partidária, não podem beneficiar das violações de direitos, nem do mau uso do aparelho do Estado. Todos os erros e ilegalidades dos titulares de cargos políticos, se refletirão em mais impostos e piores educação, saúde e segurança social, comunicações, segurança pública, justiça. Imediatamente ou a prazo, ainda que em graus diferenciados, cada um será atingido. A indiferença pelo que se julga atingir apenas os outros, além de um equívoco, conduz à convicção da impunidade dos que capturaram o aparelho do Estado. Que, até por isso, se tornarão mais audaciosos.
Os que governam não são chamados a governar. São eles que pedem ao povo que os designe para isso, através do consentimento dado pelo sufrágio; mas a tendência geral é a de, posteriormente, considerarem a incumbência como um sacrifício que deve ser agradecido e que, pela qualidade, deve proporcionar privilégios, apesar da análise dos factos mostrar que aquela, só raramente assume relevância.
Convém lembrar-lhes, insistentemente, que a sua vontade só terá sentido, quando exercida de acordo com o quadro institucional que o povo soberano previamente define, deixando a menor margem possível ao seu voluntarismo; o que implica a existência de mecanismos de fiscalização e controlo dos agentes políticos.
Trata-se, afinal, de exigir dos que, pelo sufrágio, obtiveram autorização para exercitar os instrumentos e as competências do governo ou de quaisquer outros cargos políticos, que atuem em conformidade com a vontade e o interesse geral do soberano. O Povo!
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